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ENTRE MERCADO E IDENTIDADE: uma investigação projetual sobre possibilidades de infiltração no modus operandi da construção carioca
larissa monteiro
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21/ RJ
Melhores trabalhos de conclusão de curso: eleito pela Plataforma Archdaily/ 2022
Ao percorrer a metrópole do Rio de Janeiro, é possível observar um modelo de urbanização compacto e difuso, com grandes disparidades construtivas. As diversas áreas da cidade foram produzidas por diferentes forças, desde mercado imobiliário, passando por iniciativas públicas, mas massivamente por força da autoconstrução. Estima-se que mais de 80% da cidade do Rio tenha sido construída sem participação de arquitetas.
A distância comunicativa da profissão não é uma questão nova, mas já debatida um sem número de vezes em conferências e debates. Durante um debate na AA em 2006, Robert Somol evoca este ponto como um problema a ser encarado pelos arquitetos: “O novo problema para os arquitetos, seja sua ambição crítica ou projetiva, é: como realmente nos comunicamos com o público?”.
No âmbito da produção imobiliária, enquanto muitos de nós, arquitetas(os), negamos participação neste mercado pelas problemáticas envolvidas - produção de cidade excludente, dimensões e organização espacial de moradias questionáveis, etc.- ele continua existindo. Prova disso é sua materialização como principal responsável na construção durante o boom imobiliário promovido pelo Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV), no Rio de Janeiro.
Na busca por referências Latino-Americanas de novas práticas, que possuem realidades próximas às nossas, é possível encontrar em práticas de escritórios como Adamo-Faiden, formas de participar ativamente da construção da cidade atuando na provisão dos processos da produção imobiliária. E ainda em escritórios como Al Borde, La Cabina de la Curiosidade, formas de intervir em habitações já construídas em condições precárias e resultantes de processos informais como encontradas na periferia do Rio de Janeiro. Estas práticas que visam um envolvimento com escalas menores de arquitetura fogem da ideologia dominante nos centros de ensino: produzir grandes arquiteturas que evocam paradigmas implicados em lógicas de desenho positivistas e desenvolvimentistas.
Este trabalho investiga possibilidades econômicas e processos identitários, buscando formas de promover o “deslocamento do arquiteto de sua posição de projetista, prestador de serviços, para a de construtor”, para concentrar maior poder de decisão” (MACIEL, Carlos Alberto). Esta postura poderia gerar a possibilidade de uma atuação mais comprometida com áreas ditas periféricas, autoconstruídas, em diferentes modelos de atuação. Além de tornar possível que se estabeleça a prática da arquitetura como um direito cultural, de expressão territorial, auxiliando na comunicação do campo, buscando assim uma atuação menos elitizada e mais democrática.
O processo de investigação se iniciou ao mapear os projetos considerados representantes da chamada “Escola Carioca”. Após a constatação de que estes projetos se concentram majoritariamente em áreas onde o valor/m² da cidade é mais cara e a constituição racial é hegemonicamente branca, buscou-se entender o que como foi construído o que não está neste recorte. Os IAPs, embora não sejam considerados parte de uma produção arquitetônica “mapeável”, poderiam ser considerados oportunidades de pensar a construção da cidade através da escala arquitetônica e mais ainda, pensar a estética como modo de comunicar a prática arquitetônica como um
direito cultural.
Embora a produção da Escola Carioca seja muito importante, abarca um recorte temporal muito distante. Com isso surgiu então a necessidade de entender como a produção contemporânea tem se especializado. Embora haja algumas mudanças, a produção da chamada “Nova Arquitetura Carioca” segue um padrão de fixação territorial muito parecida da produção moderna. Seu paralelo, PMCMV entretanto, quando tratando de faixas de renda mais baixas, foram implantados em lugares cada vez mais distantes das oportunidades de trabalho e em espaço cada vez menos infraestruturados.
Além de georeferenciar os projetos - ver Mapeamento da segregação socio-racial da prática da 'boa arquitetura" no Rio de Janeiro), foi essencial também entender qual o tipo de arquitetura e relação com a cidade e paisagem vem sendo construída ao longo do tempo. Para isso foi preciso estabelecer parâmetros de análise e ao mesmo tempo escolher projetos específicos que possam dar conta de falar sobre as questões levantadas.
De forma proposital as características elencadas fogem do debate sobre dimensões mínimas de habitação, qualidade de iluminação e ventilação. Esta escolha se deu pois são aqui considerados escopo projetual mínimo e não uma meta. Esta argumentação parte da observação que projetos localizados em recortes periféricos costumam ser pensados com caráter apenas resolutivo. Para um melhor entendimento do que seria então a qualidade arquitetônica que se almeja alcançar, foram estabelecidos conceitos sobre aspectos específicos dos projetos analisados e a seguir, gradações destes mesmos conceitos. Segue na terceira coluna ao lado uma explicação sobre as características.